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O Recesso Forense: entre a suspensão processual e o exercício da razão jurídica

  • Foto do escritor: Marco Túlio Elias Alves
    Marco Túlio Elias Alves
  • 15 de dez.
  • 4 min de leitura

Marco Túlio Elias Alves


O recesso forense não é, como por vezes se supõe nas esquinas do senso comum, uma licença ampla, geral e irrestrita concedida aos operadores do Direito para o ócio absoluto. Antes, é instituto peculiar, de traços próprios, dotado de previsão normativa específica, que opera a suspensão dos prazos processuais, mas não impõe o fechamento completo das portas da Justiça.


De início, é fundamental distinguir o recesso forense das chamadas férias forenses — confusão recorrente até mesmo entre bacharéis menos atentos ao rigor da técnica. As férias forenses, previstas no art. 93, inciso XII, da Constituição Federal, referem-se ao direito dos magistrados a trinta dias de descanso anual. Já o recesso forense, fixado pela Lei nº 5.010/1966 e pelo Código de Processo Civil (art. 220), compreende o período de 20 de dezembro a 20 de janeiro, quando há, por regra, suspensão dos prazos processuais, audiências e sessões de julgamento, sem, contudo, impedir o funcionamento em regime de plantão.


Ora, o advogado, este eterno vigilante da legalidade, que não se submete à rigidez de jornadas, tampouco ao privilégio de recesso remunerado, encontra nesse intervalo uma rara e necessária oportunidade. Não é tempo perdido; é ocasião para repouso do corpo e do espírito, mas, sobretudo, para reflexão estratégica. Como nos ensinou Pontes de Miranda, o Direito exige o labor mental contínuo, mas esse labor só frutifica quando encontra repouso metódico.


Deve, pois, o causídico, utilizar o recesso como período de reavaliação de sua atuação processual. É o momento de revisitar petições já lançadas, examinar estratégias de litígios em curso, ajustar condutas diante de novos precedentes e reorganizar seu próprio compêndio de teses. Afinal, a advocacia não é arte estática: é ciência movente, que exige constante atualização e análise crítica.


Além disso, é prudente lançar mão do tempo para planejamento do ano vindouro. Definir metas profissionais, investir em capacitação — seja por meio de cursos, leitura sistemática ou estudos de casos —, e revisar os instrumentos de gestão do escritório são ações que se traduzem, no médio e longo prazo, em maior eficiência e rentabilidade. Não se trata de empreender a qualquer custo, mas de investir no próprio ofício com método e clareza de propósitos.


Recomenda-se também ao advogado o cultivo de práticas de saúde mental. O peso das lides forenses não é leve: enfrentam-se dores alheias, injustiças gritantes, burocracias sufocantes. Portanto, desligar-se da máquina por alguns dias, aproximar-se da arte, da natureza, da família, é tão necessário quanto protocolar petições com prazo em curso. O recesso não deve ser apenas suspensão dos prazos — deve ser, sobretudo, suspensão do excesso.


E se porventura restarem pendências urgentes, que se apresentem inadiáveis, haverá sempre o plantão judiciário, regime excepcional que assegura o atendimento das demandas que não podem aguardar o calendário. Mas que se utilize essa via com parcimônia, em respeito ao sistema e aos próprios limites humanos.


Enfim, o recesso forense, embora limitado em sua amplitude, é oportunidade de ouro. Não para a inércia inconsequente, mas para o descanso produtivo.


Advocacia estratégica: como o recesso pode mudar seu ano


Todo advogado sabe: o ano começa de fato após o recesso forense. O intervalo entre 20 de dezembro e 20 de janeiro é mais que um respiro institucional — é o período ideal para repensar, recalibrar e retomar a prática com energia renovada e foco ajustado. Ignorar esse potencial é desperdiçar uma das mais valiosas janelas do calendário jurídico.


O recesso é o tempo da virada estratégica. Sem o bombardeio diário de prazos e audiências, é possível olhar para o próprio escritório com a lente da análise crítica. O que funcionou? O que precisa ser reformulado? Os processos estão organizados? Há áreas de atuação que merecem mais atenção? Estas são perguntas que o advogado deve se fazer, de preferência com papel e caneta à mão, para desenhar um plano de ação robusto.


Outro ponto-chave é o relacionamento com os clientes. Durante o recesso, há espaço para contatos mais personalizados, sem a urgência costumeira. Telefonemas de cortesia, atualizações sobre o andamento de processos e, até mesmo, mensagens de fim de ano bem redigidas são gestos que humanizam a relação profissional e reforçam a confiança do cliente.

Do ponto de vista financeiro, o período também é oportuno para revisão de contratos, análise de receitas e despesas, e definição de honorários mais adequados. Um bom planejamento fiscal e a preparação para o início do ano contábil são ações que evitam surpresas desagradáveis e fortalecem a sustentabilidade do escritório.


A capacitação entra como aliada fundamental. Participar de cursos, congressos online, grupos de estudo ou, simplesmente, ler aquele livro jurídico que ficou na estante o ano inteiro pode fazer toda a diferença na qualidade da atuação futura. Atualização é diferencial competitivo — e o recesso é o momento ideal para ela.


Há ainda uma dimensão mais pessoal: o descanso genuíno. Desconectar-se de e-mails, grupos de WhatsApp jurídicos e plataformas de acompanhamento processual por alguns dias é necessário para preservar a saúde mental. Afinal, não há advogado eficaz que resista ao estresse contínuo sem pagar um preço alto.


O recesso também é ótimo para revisitar metas de longo prazo. Deseja mudar de área? Especializar-se em um nicho? Mudar o modelo de atendimento? Ter tempo para pensar com calma nessas questões é um luxo que o resto do ano não oferece.


Em síntese, o recesso forense é mais do que um intervalo: é uma alavanca. Cabe ao advogado escolher entre o simples repouso e o descanso estratégico. Um mês bem utilizado pode ser o diferencial entre mais um ano corrido e um ano de evolução consistente.


Como dizia Pontes de Miranda, "há mais lógica no silêncio do que no ruído das palavras ocas". E é no silêncio do recesso que o advogado mais atento encontra a sabedoria para um ano inteiro de atuação brilhante.


Marco Túlio Elias Alves é advogado
Marco Túlio Elias Alves é advogado

 
 
 

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